MinC: O debate é entre o comum e o privado
24 de janeiro de 2011 às 14:43
por Rovai
O texto (abaixo) sobre a decisão do MinC de retirar do seu site a licença Creative Commons e ao mesmo tempo solicitar à Casa Civil o projeto de Direitos Autorais causou polêmica tanto neste blog quanto em outros espaços que o republicaram.
A maior parte dos internautas manifestou preocupação com as medidas. Um setor menor, mas não inexpressivo, preferiu acusar o autor do texto tanto de estar a serviço de interesses imperialistas como de fazer parte de uma “frente” anti Ana de Hollanda.
A acusação de imperialista cultural por defender o licenciamento em Creative Commons é tão tacanha que me permito não respondê-la.
Em relação ao fato de fazer jogo deste ou daquele grupo, registro que participo de debates culturais há algum tempo e por isso conhecia alguns dos principais colaboradores da gestão anterior no ministério.
Mas também conheço e admiro alguns dos que ganharam espaço com Ana de Holanda.
Ou seja, não é essa a questão. Ela é outra, bem outra…
O fato de o Minc deixar de licenciar o seu site em Creative Commons foi um ato político. Uma declaração de que há uma nova postura no ministério em relação ao debate dos direitos autorais.
A nota que o ministério emitiu alegando que só trocou a licença por uma frase em português liberando o conteúdo não dá conta do problema. Em relação a isso, vale a pena ler a matéria da revista Rede em que o professor Ronaldo Lemos , da Fundação Getúlio Vargas, explica as diferenças.
Há outras tantas que poderiam ser listadas. Quem sabe num outro post…
O ponto central que quero discutir nesse novo texto é que a retirada do CC do site do ministério parece indicar que a política nesta área de direitos autorais vai ser modificada. O que muda muita coisa.
Ao que muda então.
No governo Lula, o MinC foi aliado da luta para garantir que os bens culturais pudessem ser acessados por toda a população e trabalhou no sentido de construir pontes para debater novas formas de financiamento para o produtor cultural.
Isso equivale dizer que o Estado fez seu papel republicano e democratizante e não atuou como um despachante de interesses privados ou de corporações.
Quando se fala em mudar o sinal e reforçar a velha lógica dos direitos autorais o que se está sinalizando? Entre outras coisas que o ministério vai trabalhar entendendo o “direito” do artista (de poucos, diga-se de passagem) como mais relevante do que o da difusão da cultura.
Dá pra dizer também, em outras palavras, que a manutenção da indústria cultural importa mais do que a possibilidade do livre conhecimento para todos.
Quando se fala em livre conhecimento, entre outras coisas se quer dizer que se é contra criminalizar alguém por baixar música da internet ou por fazer uma cópia de um livro na faculdade.
Que se é contra impedir uma banda do interior de executar Tom Jobim porque não recolheu a grana do ECAD.
Que se é contra impedir um grupo de jovens de apresentar um espetáculo de teatro de um autor nacional importante só porque sua família não autorizou.
Ser a favor do livre conhecimento é lutar para que a maior parte dos produtos culturais esteja disponível na rede e que o maior número de brasileiros tenham acesso a eles a partir de um acesso, se possível, público e gratuito à rede.
Isso quer dizer que o livre acesso ao conhecimento não pode se submeter ao interesse comercial e privado de alguns, mas não significa que os artistas não devam ser remunerados pelo seu trabalho.
Mas significa sim que nem eles (artistas) e nem ninguém podem ser censores da difusão da obra cultural.
O que se espera de um MinC de um governo como o de Dilma é que se ele não vier a se associar a esta luta de forma clara, ao menos seja um instrumento de mediação do confronto entre os que defendem a produção cultural como algo privado. E os que a entendem como bem coletivo.
Para os que a entedem como bem coletivo é preciso libertar a produção cultural do todo poderoso mercado e impedir que seja tratada tão somente como mercadoria.
Na opinião desses, esse é o um dos papéis fundamentais do MinC e tem, sim, relação com a posição o ministério vai adotar na questão dos direitos autorais.
Este blog espera que a ministra Ana de Hollanda e os novos gestores do ministério estejam abertos para travar de forma republicana e democrática esse debate.
Ele é um debate central e guarda relação com a sociedade que desejamos construir, a do comum ou a do privado.
Não é perfumaria e nem coisa de imperialista. E quem é intelectualmente honesto sabe disso.
PS: A partir do próximo post vou começar a tratar do Fórum Social Mundial. No momento, estou na França. Chego em Senegal no dia 1 de fevereiro. Por ser uma ex-colônia francesa, o FSM do Senegal tem repercutido bastante na sociedade civil daqui.
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