Domingo de Circo
Toda tua chegada nessa radiosa manhã de domingo embandeirada de infância. Solene e festivo circo armado no terreno baldio do meu coração.
As piruetas do palhaço são malabaristas alegrias na vertigem de não saber o que faço.
Rugem feras em meu sangue; cortam-me espadas de fogo.
Motos loucas de globo da morte, rufar de tambores nas entranhas, anúncio espanholado de espetáculo, fazem de tua chegada minha sorte.
Domingo redondo aberto picadeiro, ensolarado por tão forte ardor, me refunde queima alucina:
olhos vendados,
sem rede sobre o chão,
atiro-me do trapézio
em teu amor.
Do livro A Arte de Semear Estrelas, de Frei Betto.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

FOLIA DE REIS E REISADO - história e tradição popular

FOLIA DE REIS E REISADO
    mp3 - FOLIA DE REIS - Sagarana (Extraído do CD Sertão Ponteado, de Roberto Corrêa)
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            Durante 12 dias, a partir do natal - até 6 de janeiro-, o Alferes da Folia, chefe dos foliões, pode bater à sua porta a qualquer momento, de manhãzinha, seguido dos palhaços do Reisado e de seus instrumentos barulhentos.

            Vai despertar quem estiver dormindo, pedir pemissão para entrar, tomar café e recolher dinheiro para a Folia de Reis, uma festa popular de origem portuguesa que ainda sobrevive em cidadezinhas brasileiras. Vai oferecer uma bandeira colorida, enfeitada com fitas e santinhos, enquanto, do lado de fora, os palhaços vão dançar ao som do violão, do pandeiro, do cavaquinho, recitando versos.

            Esta festa comemora o nascimento de Cristo. Seu enredo lembra a viagem que os três reis magos - Baltazar, Belchior e Gaspar - fizeram a Belém para encontrar o Menino Jesus. Os palhaços, vestidos a caráter e cobertos por máscaras, representam os soldados do rei Herodes, em jerusalém. Os foliões abrem alas com uma bandeira, que - dizem!- é abençoada e protege das más influências.
Depois de 12 dias de jornada, o dinheiro arrecadado é gasto em comes e bebes para todos.
            O Reisado é uma das pantomimas folclóricas mais ricas e mais apreciadas, principalmente no Nordeste. Faz parte do repertório das Festas Jesuínas, e é apresentado de 24 de dezembro a 6 de janeiro, isto é, pelo Natal, Ano Bom e Reis.
            É formado por um grupo de foliões, de pastores e pastoras que se reúnem numa espécie de rancho, com o fim de visitar as casas das pessoas mais gradas e hospitaleiras da região, a cantar e a dançar.
            O reisado apresenta diversas modalidades e compõe-se de várias partes:
a) abrição da porta; b) entrada; c) louvação ao Divino; d) chamadas do rei; e) peças de sala;
f) danças; g) a guerra; h) as sortes; i) encerramento da função.
Tem como principais personagens: o rei, o mestre, o contramestre, Mateus, Catarina, figuras e moleques.
Juca Martins / Pulsar
            Indumentária:
            Rei - culote até os joelhos, terminado por franjas, blusa de cetim de cor diferente com mangas compridas; no peito, espelhinhos; manto de cetim dourado que cai até os joelhos; coroa de ouro, cetro.
            Mestre - chapéu de palha, forrado de cetim, de aba dobrada na testa (como usam os cangaceiros) adornado com muitos espelhinhos, bordados dourados e flores artificiais; da parte não dobrada da aba pendem fitas compridas de cores variadas, saiote de cetineta até a altura dos joelhos, de cores vivas, com grega de galões largos; por baixo saia branca, com dois ou três babados; blusa, peitoral e capa.
            Contramestre - idêntica à do Mestre, porém menos pomposa.
            Mateus - paletó e calça de brim com placas de remendos, alpercatas de couro cru, chapéu de palha enfeitado com espelhinhos e franjas, penduricalhos ao peito, como se fossem medalhas, cantil e bornal a tiracolo; pandeiro, espingarda de bambu.
            Catarina (palhaça) - roupa de tecido xadrez, de maneira a lembrar um palhaço.
            Figuras - trajes idênticos ao do mestre, porém mais pobres e mais simples.
Nair Benedicto / N Imagens
Nair Benedicto / N Imagens
Nair Benedicto / N Imagens

            Inicia-se o folguedo com o rei seguido do mestre e do contramestre e acompanhado de meninos que trazem grandes candeias de querosene, conduzindo o reisado. Atrás seguem os dançadores de entremeios, com baús cheios de máscaras e trajes. Entoam marchas ao som de violas, harmônicas, maracás, rabeca, pandeiros e vão em demanda das casas onde celebram sua função.
            Abrição da porta: O mestre dirige a evolução do episódio por meio de apitos. Canta-se e dança-se com volteios altivos e elegantes. O reluzir dos espelhos e das lantejoulas produz grande efeito pictórico. Mateus vai aboiando dando uma nota de comicidade à função. Terminam pedindo licença para entrar.
            Entrada: Entram os tocadores, criando animação, seguidos do rei, do mestre, do contra-mestre e das figuras, portando-se todos com garbo e imponência. Cantam a peça da entrada e fazem elogios ao dono da casa. Executam marchas e contramarchas em ritmo ligeiro e com passos arrastados.
            Louvação ao Divino: O reisado dirige-se ao presépio ou à capela da casa visitada. Ajoelham.  Cantam em louvação ao Divino, ao som da música, mas os maracás são abafados com as mãos para produzir um som surdo. Voltam à sala. O rei ocupa o trono. As figuras colocam-se em duas filas. Realizam-se, então, os entremeios, os episódios de guerra e as embaixadas. O mestre dirige a peça.
            Chamadas do rei: Ao fim de uma peça, ou de um entremeio, o rei levanta-se do trono, chama o mestre e com ele cruza sua espada, em ressoantes entrechoques, enquanto estabelece com ele uma série de embaixadas.
            Peças de sala: Antes e depois das embaixadas, são cantadas e dançadas as peças de sala. Estas são críticas, comentários, sátiras sobre fatos ou acontecimentos ligados à vida de pessoas ou do povo da região.
            Danças: As danças são numerosas e variadas, como, por exemplo, a dança do gingá com o entremeio da mamãe velha.
            Neste, como 1º passo, os figurantes acocoram-se e balançam e remexem os traseiros para os lados;
            2º passo (da máquila): é um passo também exibido nos guerreiros e caboclinhos. Sua execução é muito bonita e consiste num pequeno pulo, seguido por cruzamento das pernas, com balanços alternados do corpo para os lados; 3º passo, costas com costas - os dois cordões colocam-se de costas um para o outro e, em seguida, se ajoelham; 4º passo, os figurantes sapateiam na primeira parte da cantiga, depois executam evoluções sincrônicas de volta completa para um lado e a seguir para o outro. Esta figura é seguida por ligeiros e também sincrônicos movimentos em que ora apoiam nas pontas dos pés, ora nos calcanhares, finalizando com quatro rápidos tropéis; 5º passo, o dançarino faz pião com o calcanhar esquerdo e de uma volta rápida para o mesmo lado. Em seguida, apoiando-se sobre o outro calcanhar, gira inversamente, imitando o movimento de um corrupio; 6º passo, os dançarinos cruzam as pernas, ora a direita à frente da esquerda, ora esta última à frente da direita, enquanto os pés se movimentam; 7º passo, idêntico ao passo anterior, executado, porém, não de modo lento e compassado mas com movimentos rápidos e quase pulados; 8º passo, consiste de sapateados, apresentando muitas variantes com diferentes nomes, dos quais podemos citar os seguintes: a) passo 40 ou marcha três tropéis, batidos sem os dançarinos saírem de seus lugares; b) três tropéis, batidos como antes, porém sendo três para a frente e três para trás; c) quatro tropéis para frente e quatro para trás, de acordo com o ritmo; 9º passo, é a dança mais comum e consiste em dois passos dirigidos para um lado e um pouco para a frente, e dois outros dirigidos para o lado contrário e um pouco para trás, com requebros do corpo para os lados aonde se dirigem os passos. O corpo vai virando continuamente, de modo que os figurantes volteiam em movimentos independentes.
            A Guerra: O mestre apita e o primeiro embaixador atende. Cruza espadas e inicia embaixadas de guerra, primeiro com o mestre, depois com o rei. Quando chega a vez do segundo embaixador, as embaixadas já se tornam cansativas, repetindo-se as batidas de espadas. Por fim, todos os figurantes, inclusive o rei e o mestre se empenham na luta e o combate se torna geral.
            As sortes: Todos os figurantes, até o próprio rei, atiram seus lenços aos donos da casa e à assistência. Estes os devolvem com dinheiro dentro. Recolhidas as sortes, o mestre apita e as filas de dançarinos se afastam para os lados. Então começam os entremeios. Estes são composições teatrais, jocosas, burlescas, como o bumba-meu-boi, o cavalo-marinho, etc.
            Encerrados os entremeios, voltam as danças e cantorias de peças, sucedem-se as embaixadas até que sejam apresentados novos entremeios. Note-se, de passagem, que os personagens dos entremeios não tomam parte nas danças das embaixadas.
            São os entremeios que dão maior brilho a esta dança dramática e são tão apreciados que alguns são apresentados mesmo fora de sua época como, por exemplo, (o famoso bumba-meu-boi, o boi simboliza o do presépio) que, inicialmente, era o principal entremeio do reisado e é levado agora também nas Festas Juninas.
            Muitos destes entremeios, deliciosos quadros independentes, revelam um espirito chistoso, outros se inspiram em motivos míticos ou totêmicos, como o Zabelê.
            Folharal: Nesta dança, o personagem oculta a cabeça sob uma cabaça donde pendem longas folhas de samambaia, traja um camisolão coberto de folhas e capim. Aumenta seu fantástico aspecto quando os longos cabelos de samambaia esvoaçam nos continues rodopios dados pelo bailarino.
            Zabelê: O dançarino, disfarçado num saco pintado, usando máscara com bico, dança e assobia, imitando o pássaro jacu.
            Curiabá: O dançarino imita o macaco, se coça dançando e faz mil trejeitos engraçados.
            Sapo Cururu: Agachado no chão, o dançarino coaxa e dá estranhos pulos.
            Alma, Diabo e Miguel: É um entremeio que deixa a assistência suspensa e trêmula de medo. A alma, envolta em lençol branco, desfiando um rosário, gemendo, aparece. Foge do Diabo que, todo vestido de vermelho com rabo e garras afiadas, a persegue. Agarra-a mas quando já a arrasta para o inferno, interpõe-se no seu caminho o anjo São Miguel, geralmente representado por uma moça, de asas brancas e espada em riste. Trava-se uma luta entre ele e o Diabo que é vencido. Há um forte estouro de pólvora na sala e o Diabo aproveita a oportunidade para desaparecer da cena. Suspiros de alívio na assistência.
            Entre inúmeros outros, podem-se ainda citar o Lobisomem, o Matuto e o Fantasma, o Capitão de Campo, o Pescador e a Sereia.
            E assim, os artistas que representam os entremeios aproveitam cada embaixada para correrem aos baús por eles trazidos no cortejo, de onde tiram febrilmente suas fantasias inesgotáveis.
            Data de registro: meados do século XX (~1950)


Textos extraídos de Terra Brasileira - www.terrabrasileira.net

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