Domingo de Circo
Toda tua chegada nessa radiosa manhã de domingo embandeirada de infância. Solene e festivo circo armado no terreno baldio do meu coração.
As piruetas do palhaço são malabaristas alegrias na vertigem de não saber o que faço.
Rugem feras em meu sangue; cortam-me espadas de fogo.
Motos loucas de globo da morte, rufar de tambores nas entranhas, anúncio espanholado de espetáculo, fazem de tua chegada minha sorte.
Domingo redondo aberto picadeiro, ensolarado por tão forte ardor, me refunde queima alucina:
olhos vendados,
sem rede sobre o chão,
atiro-me do trapézio
em teu amor.
Do livro A Arte de Semear Estrelas, de Frei Betto.

quarta-feira, 30 de julho de 2014

30/07/1906 nascia Mario Quintana



Vivinho em nós!
Viva Quintana!!!

10 poemas aqui:

A Rua dos Cataventos

Da vez primeira em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.
Hoje, dos meu cadáveres eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada.
Arde um toco de Vela amarelada,
Como único bem que me ficou.
Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!
Pois dessa mão avaramente adunca
Não haverão de arrancar a luz sagrada!
Aves da noite! Asas do horror! Voejai!
Que a luz trêmula e triste como um ai,
A luz de um morto não se apaga nunca!

Do amoroso esquecimento

Eu agora — que desfecho!
Já nem penso mais em ti…
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Segunda canção de muito longe

Havia um corredor que fazia cotovelo:
Um mistério encanando com outro mistério, no escuro…
Mas vamos fechar os olhos
E pensar numa outra cousa…
Vamos ouvir o ruído cantado, o ruído arrastado das correntes no algibe,
Puxando a água fresca e profunda.
Havia no arco do algibe trepadeiras trêmulas.
Nós nos debruçávamos à borda, gritando os nomes uns dos outros,
E lá dentro as palavras ressoavam fortes, cavernosas como vozes de leões.
Nós éramos quatro, uma prima, dois negrinhos e eu.
Havia os azulejos, o muro do quintal, que limitava o mundo,
Uma paineira enorme e, sempre e cada vez mais, os grilos e as estrelas…
Havia todos os ruídos, todas as vozes daqueles tempos…
As lindas e absurdas cantigas, tia Tula ralhando os cachorros,
O chiar das chaleiras…
Onde andará agora o pince-nez da tia Tula
Que ela não achava nunca?
A pobre não chegou a terminar o Toutinegra do Moinho,
Que saía em folhetim no Correio do Povo!…
A última vez que a vi, ela ia dobrando aquele corredor escuro.
Ia encolhida, pequenininha, humilde. Seus passos não faziam ruído.
E ela nem se voltou para trás!

Emergência

Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela
abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo —
para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.

Poeminho do Contra

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão…
Eu passarinho!

Relógio

O mais feroz dos animais domésticos
é o relógio de parede:
conheço um que já devorou
três gerações da minha família.

Os Poemas

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem. E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti…

Esperança

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E — ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança…
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA…

Envelhecer

Antes, todos os caminhos iam.
Agora todos os caminhos vêm
A casa é acolhedora, os livros poucos.
E eu mesmo preparo o chá para os fantasmas.

Tic-tac

Esse tic-tac dos relógios
é a máquina de costura do Tempo
a fabricar mortalhas.

Café & consertos de coisas de graça contra a obsolescência programada



Os cafés onde voluntários consertam coisas de graça para protestar contra a obsolescência programada

Você já ouviu falar que os produtos de hoje em dia são feitos para durar pouco? Se antes um guarda-chuva durava anos, hoje ele quebra na primeira tempestade. Se antes uma televisão ficava na sala por 5, 10 anos, hoje ela é trocada a cada 2 ou 3. A essa curta vida útil dos produtos se dá o nome de obsolescência programada.
Mas trocar de TV, carro ou celular não traz apenas o benefício da tecnologia. É preciso também pensar nos danos que isso traz para o meio ambiente. Foi assim que surgiu o Repair Café, um conceito de café em que as pessoas de uma vizinhança se reúnem para consertar objetos quebrados em vez de jogá-los fora e comprar novos.
O primeiro Repair Café do mundo foi criado em Amsterdã, na Holanda, por Martine Postma. Em um determinado dia da semana, voluntários se reúnem para consertar itens que vão de brinquedos quebrados e roupas descosturadas a secadores de cabelo que não funcionam mais. Todos os reparos são feitos gratuitamente, como em uma troca de gentilezas e aprendizado entre os moradores da região. A ideia deu tão certo que hoje existem mais de 300 Repair Cafés em mais de 10 países do mundo. No Brasil há um único Repair Café, que acontece através da ANDES e fica em Santos (SP).

Que tal levar essa ideia para outras cidades?



http://www.hypeness.com.br/2014/07/o-conceito-de-cafe-em-que-voluntarios-consertam-desde-uma-geladeira-ate-uma-boneca/

domingo, 27 de julho de 2014

As ameaças da Grande Transformação(I)

A Grande Transformação consiste na passagem de uma economia de mercado para uma sociedade de mercado. Ou em outra formulação: de uma sociedade com comercado para uma sociedade só de mercado. Mercado sempre existiu na história da humanidade, mas nunca uma sociedade só de mercado. Quer dizer, uma sociedade que coloca a economia como o eixo estruturador único de toda a vida social, submetendo a ela a política e anulando a ética. Tudo é vendável, até o sagrado.

Não se trata de qualquer tipo de mercado. É o mercado que se rege pela competição e não pela cooperação. O que conta é o benefício econômico individual ou corporativo e não o bem comum de toda uma sociedade. Geralmente este benefício é alcaçado às custas da devastação da natureza e da gestação perversa de desigualdades sociais. Nesse sentido a tese de Thomas Piketty em O capital no século XXI é irrefutável.
O mercado deve ser livre, portanto, recusa controles e vê o Estado como seu grande empecilho, cuja missão, sabemos, é ordenar com leis e normas a sociedade, também o campo econômico e coordenar a busca comum do bem comum. A Grande Transformação postula um Estado mínimo, limitado praticamente às questões ligadas à infra-estrutura da sociedade, ao fisco, mantido o mais baixo possível e à segurança.Tudo o mais deve ser buscado no mercado, pagando.
O gênio da mercantilização de tudo penetrou em todos os setores da sociedade: a saúde, a educação, o esporte, o mundo das artes e do entretenimeno e até grupos importantes das religiões e das igrejas. Estas incorporaram a lógica do mercado: a criação de uma massa enorme de consumidores de bens simbólicos, igrejas pobres em espírito, mas ricas em meios de fazer dinheiro. Não raro no mesmo complexo funciona um templo e junto a ele um shopping. Enfim, se trata sempre da mesma coisa: auferir rendas seja com bens materiais seja com bens “espirituais”.
Quem estudou em detalhe este processo avassalador foi um historiador da economia, o húngaro-norte-americano Karl Polanyi (1886-1964). Ele cunhou a expressão A Grande Transformação, título do livro escrito antes do final da Segunda Guerra Mundia em 1944. No seu tempo a obra não mereceu especial atenção. Hoje, quando suas teses se vem mais e mais confirmadas, tornou-se leitura obrigatória para todos os que se propõem entender o que está ocorrendo no campo da economia com repercusão em todos os âmbitos da atividade humana, não excluida a religiosa. Desconfia-se que o próprio Papa Francisco tenha se inspirado en Polaniy para criticar a atual mercantilização de tudo, até do ser humano e órgãos.
Essa forma de organizar a sociedade ao redor dos interesses econômicos do mercado cindiu a humanidade de cima a baixo: um fosso enorme se criou entre os poucos ricos e os muitos pobres. Gestou-se uma espantosa injustiça social com multidões feitas descartáveis, consideradas óleo gasto, não mais interessante para o mercado: produzem irrisoriamente e consomem quase nada.
Simultaneamente a Grande Transformação da sociedade em mercado criou também uma iníqua injustiça ecológica. No afã de acumular, foram explorados de forma predatória bens e serviços da natureza, devastando inteiros ecossistemas, contaminando os solos, as águas, os ares e os alimentos, sem qualquer outra consideração ética, social ou sanitária.
Um projeto desta natureza, de acumulação ilimitada, não é suportado por um planeta limitado, pequeno, velho e doente. Eis que surgiu um problema sistêmico, do qual os economistas deste tipo de economia, raramente se referem: foram atingidos os limites fisico-químicos-ecológicos do planeta Terra. Tal fato dificulta senão impede a reprodução do sistema que precisa de uma Terra, repleta de “recursos” (bens e serviços ou ‘bondades’ na lingugem dos indígenas).
A continuar por esse rumo, poderemos experimentar, como já o estamos experimentando, reações violentas da Terra. Como é um Ente vivo que se autoregula, reage para manter seu equilíbrio afetado através de eventos extremos, terremotos, tsunamis, tufões e uma completa desregulação dos climas.
Essa Transformação, por sua lógica interna, está se tornando biocida, ecocida e geocida. Destrói sistematicamente as bases que sustentam a vida. A vida corre risco e a espécie humana pode, seja pelas armas de destruição em massa existentes seja pelo caos ecológico, desaparecer da face da Terra. Seria a consequência de nossa irresponsabilidade e da total falta de cuidado por tudo o que existe e vive.
Leonardo Boff escreveu Proteger a Terra-cuidar da vida: como escapar do fim do mundo, Record 2010.


http://leonardoboff.wordpress.com/2014/07/26/as-ameacas-da-grande-transformacaoi/

Antônio da Conceição, cobrador, monta biblioteca dentro de ônibus em Brasília

Antônio da Conceição Ferreira tem um acervo de quase 8 mil obras.

Desde 2003, ele recebe doações e empresta livros a passageiros.


 Cobrador monta estante para os livros diariamente


Um trocador de ônibus que montou uma biblioteca pública em uma linha circular entre Sobradinho e o Plano Piloto, em Brasília, tem hoje um acervo de quase 8 mil livros e, sempre que começa o expediente, oferece uma estante com 25 títulos para emprestar aos passageiros.
Antônio da Conceição Ferreira começou o projeto ‘Cultura no ônibus’ em 2003, graças a doações de passageiros e de internautas que acessam seu blog.
No começo, ele até anotava o nome de quem pegava os livros emprestados, mas chegou um momento em que a devolução era de quase 100% e o trocador parou de controlar o empréstimo dos livros.
Em 2009, Antônio ganhava R$ 579 como cobrador de ônibus. Desse dinheiro, usava R$ 280 para pagar o aluguel da casa e R$ 120 para alugar o quarto para os livros. Portanto, tirava um quarto do salário para fazer a biblioteca.
Em 2010, estudantes de Biblioteconomia começaram a ajudá-lo na catalogação dos livros, tornando o trabalho um pouco mais profissional para que Antônio pudesse fazer uma biblioteca comunitária em Sobradinho II. Ele ainda não conseguiu realizar esse sonho, mas segue na luta para concluir o projeto.



Saiba como ajudar no blog ‘Cultura no ônibus’.


Barco Sorriso promove a saúde bucal de crianças de comunidades litorâneas


Grupo de voluntários dedicados a melhorar a qualidade de vida nas comunidades litorâneas de difícil acesso no Paraná, "SEM AFETAR SEUS COSTUMES OU A CULTURA LOCAL." Promovem a saúde bucal das crianças!!!

Leia aqui uma reportagem completa sobre o projeto, feita por Carmela Scarpi, da EVEN MORE:

http://evenmore.com.br/cultura/aconteceu/barcosorriso


Conheça mais em Barco Sorriso


10 vídeos de Aruana Suassuna

Na tarde desta última quarta-feira (23), a literatura brasileira perdeu Ariano Suassuna. O escritor, dramaturgo e poeta faleceu em Recife, aos 87 anos de idade.
Autor de obras marcantes como "Auto da Compadecida", Suassuna também deixou sua marca na internet. Mesmo sem uma presença digital com perfis oficiais, o autor era (e ainda é) figura constante em vídeos do Youtube que mostram um pouco de sua personalidade bem-humorada.

Projeto Freguesia do Livro estimula a leitura no Paraná

Livros em movimento


Descrição 
Recebemos livros em doação e com eles fazemos pontos de leitura como os que você pode ver aqui:
http://freguesiadolivro.wordpress.com/pontos-de-leitura/

1. O que é?
A Freguesia do Livro é um movimento lítero-libertário que dá nova vida aos livros esquecidos em prateleiras e bibliotecas. Arrecada, organiza e encaminha bons livros que são recebidos como doação para bibliotecas comunitárias em Curitiba e região metropolitana (e cidades que conseguimos alcançar).
A Freguesia do Livro também se propõe a colaborar na criação e manutenção de novas pequenas bibliotecas.

2. Como atua?
Recebemos doações de livros em bom estado que são selecionados, classificados e encaminhados para bibliotecas comunitárias cadastradas.
Para receber os livros da Freguesia, para aumentar e/ou renovar acervos de pequenas bibliotecas já existentes ou criar pontos de leitura devem cadastrar-se em nosso site.

3. Quem pode participar? Como?
A Freguesia do Livro é um movimento voluntário, participa quem acredita que divulgar a leitura e facilitar o acesso aos livros pode fazer diferença no desenvolvimento de uma comunidade. Você pode ajudar: sendo ponto de recepção de doações, doando livros, como ponto de leitura (onde ficam disponibilizados os livros) ou biblioteca, recolhendo e distribuindo doações. Escolha o jeito de participar com o qual você mais se identifica.

4. Quais bibliotecas e iniciativas literárias podem receber livros da Freguesia do Livro?
Bibliotecas comunitárias entendidas como iniciativas independentes e informais. Ou seja, locais que possam receber os livros e disponibilizá-los ao público que os frequenta. As bibliotecas livres podem ser colocadas em lugares inusitados como creches, restaurantes, cabeleireiros, farmácias, cafés, terminais de ônibus, igrejas, etc. Bibliotecas livres trazem o conceito do empréstimo sem formalidades: o livro vai, se voltar, voltou. O importante é que depois de lido, ele continue circulando. O objetivo é levar o livro para perto do leitor, criando a oportunidade e despertando o interesse, sem burocracia.

5. Como iniciar uma biblioteca comunitária? Você quer ser um Ponto de Leitura?
Basta querer. Comece preenchendo o cadastro.

6. Como você pode doar livros?
Analise seu acervo e escolha os livros que imagina que serão bem aproveitados por outras pessoas. Entre em contato através de comentários nesta página. Definiremos os Pontos de Coleta onde você pode entregar sua doação.

7. Que tipo de livros recebemos?
Se o leitor pegar firme no livro ele desmancha? As traças o perfuraram tanto que não dá nem pra ver todas as letras de uma frase? O cheiro de mofo requer máscara? Se as respostas forem não, então aceitamos. O critério é: livros em bom estado, pós 1980, que possam ser bem aproveitados por outras pessoas, com conteúdo que vale a pena. Em "Como doar", no site, você encontrará nossos critérios.

Veja reportagem da Freguesia do Livro no G1 Paraná.

Facebook  Freguesia do Livro

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Programas culturais da TV aberta ou fechada ou da internet. Todos disponíveis livremente no Youtube



Compartilho uma lista de programas culturais organicamente vivos que passam nos canais de TV's abertos e/ou fechados e/ou da internet. Todos estão disponíveis de forma livre no Youtube!!! Podem ser vistos, revistos, compartilhados livremente com as pessoas que amamos!

Então aproveite, delicie-se, divirta-se com tanta arte, informação, conhecimento, leituras vivas e culturas ricas e diversas por todas as partes, de norte a sul deste Brasilzão lindo e profundo!

E quem tiver alguma sugestão, envie-nos para circomagicodaleitura@gmail.com

Abraços fraternos,

Jonas Banhos
@jonasbanhos
Facebook Jonas Banhos
http://barcadasletras.blogspot.com.br



Afinando a Lingua

Almanaque Brasil

Amazônia Rural
https://www.youtube.com/watch?v=91JanuSibGg

Amazonsat Educação
https://www.youtube.com/watch?v=DLpkyhpN7no

Brasil Caipira
https://www.youtube.com/user/TVBRASILCAIPIRA

Bem Brasil
https://www.youtube.com/watch?v=Lks2CGbAi1c
Choro e Companhia

Literato

Letras e Livros

Literatura em Foco
https://www.youtube.com/watch?v=jThLNH9FBBY

Minuto de Cultura

Mar de Letras

Matéria Prima
https://www.youtube.com/watch?v=WOlLYHtjgfI

Movimento Violão
https://www.youtube.com/watch?v=bb5zY8JlyN8

Musicograma

Nordeste Caboclo

https://www.youtube.com/channel/UCoR3U9FqUM-TQnV2pdlxIbw


https://www.youtube.com/watch?v=gRukRZFKRyY

Teatro e Circunstância
https://www.youtube.com/watch?v=WOlLYHtjgfI

Viola Minha Viola

https://www.youtube.com/watch?v=_2Dck26UZT0

Zoombido

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Confira dez documentários que podem ajudar nos estudos

Conheça os os dez documentários no link:
http://educacao.uol.com.br/album/2014/07/14/confira-dez-documentarios-que-podem-ajudar-nos-estudos.htm#fotoNav=1

Abaixo leia uma reportagem sobre um dos documentários indicados:

Diretor argentino alia cinema e ativismo para romper padrões na educação
09/04/2014  -  
Pedro Ribeiro Nogueira
:

Germán Doin era um bom aluno de um colégio de classe média em Buenos Aires. Auto-declarado “vítima da educação neoliberal da década de 90”, viu seu país entrar em ebulição com os panelaços e com as frequentes crises econômicas. Aos 16, ouviu falar de uma escola sem provas. Com a sensibilidade formada nesse caldo, resolveu estudar cinema e educação. Aliando todos esses elementos, resolveu, aos 21 anos, partir em viagem pela América Latina. Levou três anos para se completar.
“Talvez esse momento dos panelaços não estivesse tão carregado desse sentimento de transformação. Mas nós terminamos de completá-lo. Era o que dava sentido à minha vida. Minha família me deu uma formação transcendental, espiritual. Meus pais passaram pela ditadura. Meu avô teve uma formação mais militante. Mas, no geral, sou filho de uma classe média que não se questionava demais, uma geração que consome muitos livros de autoajuda, como se procurasse algo de jogo, de autoconhecimento, que lhes roubaram em algum momento de suas vidas. A ditadura, a escola, lhes deixaram incompletos. Queremos uma educação que forme sujeitos integrais, empenhados em transformações.”
O resultado dessa empreitada é um filme que você talvez já tenha visto. Caso contrário, não hesite em ver. “A Educação Proibida” (disponível na íntegra com legendas em português aqui) é um longa com pouco mais de duas horas de duração, que destrincha de forma didática os mecanismos que constituíram o que hoje entendemos por educação e escola, partindo de experiências exitosas e depoimentos de especialistas. Além disso, consegue fazer com que o espectador analise o seu próprio processo educativo. Uma obra compartilhada já por mais de dez milhões de pessoas.
Coerência com o processo
Em sua viagem, Germán conheceu mais de cem experiências e propostas educativas alternativas que, ao admitir a possibilidade da dúvida, começam a traçar caminhos para um mundo diferente. Após a pesquisa, passou a agregar contribuições de amigos e estabelecer parcerias. Trouxe sua companheira e colegas para a equipe do filme. Abriu o projeto para financiamento colaborativo em uma plataforma própria, pois ainda não existiam sites para isso. Em pouco tempo, “A Educação Proibida” tornou-se o primeiro filme feito na América do Sul por meio do crowdfunding.
“Queríamos ser coerentes com o que contamos no filme. Uma das chaves escondidas da educação é algo que decidimos fazer, ou seja, soltar o volante, não controlar a criança, o currículo, o processo educativo. Tentamos fazer isso com o filme, jogando ele no mundo, o que é um processo difícil, pois há mostras de cinema e isso parece importante. Mas, desse jeito, conseguimos fazer as projeções nas salas de casa, de cinema alternativo, escolas, teatros, e estreamos em 150 salas do mundo, sete países. É algo impressionante que essa obra tome asas e ganhe o mundo, gerando reflexão. E ele foi feito quase artesanalmente, em uma garagem.”
Dois “filhos” e uma filha
Sem ter ganhado nenhum prêmio, apenas o mundo, Germán vê seu filme como uma emanação das experiências militantes argentinas da década de 60, pensado para ganhar espaços de formação política, de organização e luta. No entanto, há uma diferença fundamental: a internet. Através dela, o cineasta conseguiu dar sequência ao projeto e criou a rede Reevo (Rede de Educação Viva), na qual voluntários de todo o mundo acrescentam iniciativas de educação inovadoras, se conhecem, trocam informações, além de ampliar a rede. que já conta com mais de 1.500 experiências. “A tecnologia é política”, lembra Doin. “Ela pode reproduzir o mesmo currículo oculto da educação tradicional. Temos que encontrar formas de usá-la para o que é humano”.
Aos trinta dias da estreia da película nasceu Ami, primeira filha de Germán, um acontecimento para provar de vez a indissociabilidade entre o que propõe em seu filme e sua vida pessoal. Ele relata que o nascimento da primogênita o fez ir à terra, ter raízes claras e decidir não escalar a montanha de exposição do vídeo. Recusou convites para aparecer na televisão, “pois ela te consome”, e resolveu seguir “sempre dançando conforme a música”.
“Ser educador ou pai são as únicas profissões que não demoram quatro anos para aprender na faculdade: aprendemos desde cedo a educar uns aos outros. E isso leva tempo. Vi que não temos respostas ou verdade, mas o importante é saber mudar de ideia. O que faz sentido hoje pode não fazer amanhã. Não importa se a educação dela vai ser alternativa, ou em comunidade de aprendizagem, ou em casa. O crucial é que ela tenha uma vida rica, cheia de afeto, cuidado e vínculos. Que conheça os pais pelo que são.”
Mas, afinal, o que é a educação proibida?
Para o cineasta, educador, pai e ativista, ela é algo que atende ao que há de intrinsecamente humano, natural e abre possibilidades. Se afasta da escola-prisão, do tédio, da caricatura, do depósito de gente, do adestramento. Se inspira no modelo ateniense – do debate aberto – antes do espartano. Ensina o que está no território e não no mapa. Uma educação que sempre foi proibida de se desenvolver.
Nas centenas de escolas visitadas, Germán encontrou um elemento comum de uma educação latino-americana: o valor humano, da terra e da relação entre si e com o mundo. Conhecer a nós mesmos, nesse caso, passaria por conhecer o que nos rodeia, o que nos nutre: nossas culturas, raízes, um autoconhecimento no sentido freiriano, de trabalhar a partir do que trazemos e não com o que nos impõem.
Para isso, ele acredita que há espaço para autonomia nas atuais leis de educação dos países de nosso continente. Seria necessário, então, reinterpretá-las e aprofundá-las em direção a uma educação integral, democrática, comunitária, trabalhando da base, com formação de professores, até à formulação de políticas públicas. Buscar algo que seja “nosso” e ser protagonista desse processo.
“A educação latinoamericana tem que ser antes que tudo pensada por e para os latino- americanos, reconhecendo nossa difícil unidade. Mais do que isso não se pode dizer, pois implica reproduzir as relações de opressão e colonialismo que sempre nos interromperam. Nosso projeto foi interrompido, truncado por ditaduras, metrópoles e regimes. Temos que refazê-lo, para que não o refaçam por nós.”
fonte:
http://portal.aprendiz.uol.com.br/2014/04/09/diretor-argentino-alia-cinema-e-ativismo-para-romper-padroes-na-educacao/