Domingo de Circo
Toda tua chegada nessa radiosa manhã de domingo embandeirada de infância. Solene e festivo circo armado no terreno baldio do meu coração.
As piruetas do palhaço são malabaristas alegrias na vertigem de não saber o que faço.
Rugem feras em meu sangue; cortam-me espadas de fogo.
Motos loucas de globo da morte, rufar de tambores nas entranhas, anúncio espanholado de espetáculo, fazem de tua chegada minha sorte.
Domingo redondo aberto picadeiro, ensolarado por tão forte ardor, me refunde queima alucina:
olhos vendados,
sem rede sobre o chão,
atiro-me do trapézio
em teu amor.
Do livro A Arte de Semear Estrelas, de Frei Betto.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

No Maracatu: A BONECA É DE CERA



Calungas do maracatu Foto: Pio Figueiroa
A BONECA É DE CERA

Um dos elementos sagrados do maracatu é a Calunga, também chamada de boneca, sempre presente ao cortejo das nações africanas, do qual se originou o nosso maracatu. Segundo esclarece Alberto da Costa e Silva 1: "Mantendo-se em segredo, os vínculos entre grupos ambundos, num segredo auxiliado pela ignorância dos senhores de escravos, tinham os chefes vendidos [escravos] de mostrar a fonte do seu poder - e já agora também penhor de unidade do grupo ao Brasil -, a calunga".

Até os nossos dias a Calunga faz parte do ritual do maracatu, encarnando nos seus axés a força dos antepassados do grupo. Em sua honra são cantadas, ainda dentro da sede, as primeiras loas, quando a Calunga é retirada do altar pela dama-do- paço e passa às mãos da rainha, que a entrega à baiana mais próxima e assim se sucede, de mão em mão até retornar novamente às mãos da soberana.

No Maracatu Elefante, pesquisado entre1949-52 pelo musicólogo Guerra Peixe, três calungas se destacavam: Dona Emília, Dom Luís e Dona Leopoldina.

A boneca é de cera
É de cera e madeira
A boneca é de cera
É de cera e madeira


Para a calunga "Dona Emília" eram dedicadas as maiores atenções. A ela era entoada a primeira toada, referida acima, na cerimônia também denominada de "a dança da boneca". A ela também eram consagrados os cânticos mais fortes: é essa principal boneca levada à porta da igreja de Nossa Senhora do Rosário; com ela o Maracatu Elefante dança diante dos terreiros (de xangô) visitados. É nas canções oferecidas a Dona Emília que os músicos executam o ritmo de Luanda - o toque "para salvar os mortos" ou eguns. 2

"Dom Luís", segundo Guerra Peixe, representa "um rei africano", sendo por isso considerado como "Rei do Congo" pelos membros do grupo, bem de acordo com a interpretação recente de Alberto da Costa e Silva (op. cit.); numa clara referência aos primórdios do folguedo, coincidindo com a crença de que os poderes da Calunga estariam ligados aos seus ancestrais africanos, como bem enfoca esta loa: "A bandêra é brasilêra/ Nosso reis veio de Luanda / Ôi, viva Dona Emília / Princesa Pernambucana".


1 SILVA, Alberto da Costa e. A enxada e a lança - A África antes dos portugueses. Rio: Nova Fronteira, 1992.
2 GUERRA-PEIXE, César. in Maracatus do Recife. Prefácio de Leonardo Dantas Silva. Recife: Fundação de Cultura, 1981. 172 p. il.(Coleção Recife, v. 14).


fonte:
http://www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/1c.html

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